A comissão de juristas criada pela Câmara dos Deputados para aperfeiçoar a legislação sobre racismo recebeu nesta quinta-feira (25), em audiência pública, contribuições de entidades jurídicas da sociedade civil e de movimentos sociais para combater o racismo no sistema de justiça criminal brasileiro.
Entre as mudanças na legislação sugeridas pelos convidados estão:
– o melhor disciplinamento das abordagens policiais, hoje muito focadas na população negra, com criação do auto de busca pessoal, para detalhamento da operação;
– o fim do reconhecimento de suspeito baseado na exibição de uma única pessoa;
– a criação de ouvidorias externas em todos os órgãos judiciais criminais, compostas por pessoas da sociedade eleitas por representação popular;
– a exigência de que novas prisões dependam da existência efetiva de vagas no sistema penitenciário;
– a definição legal de “provas frágeis” do ponto de vista processual, para evitar que a defesa tenha de buscar instâncias superiores para derrubá-las;
– a não criação de tipo penal fechado para o crimes de racismo, para não dificultar a aplicação prática de penalidades;
– a exclusão de dispositivo da Lei das Contravenções Penais que trata da perturbação do sossego alheio, muito usado para perseguir cultos e práticas religiosas de matriz africana.
Também houve sugestões voltadas às polícias, como ensino de direitos humanos nas academias, julgamento de processos administrativos por não policiais e instalação de câmeras de vídeo nas viaturas.
Seletividade penal
Promotora de Justiça do Ministério Pública da Bahia, Livia Santana Vaz disse que o desafio da comissão é promover mudanças estruturais focando na seletividade racial do sistema penal, e não nos crimes de racismo.
Segundo ela, os negros são alvos preferenciais do sistema, desde a abordagem policial até o cumprimento da pena. “De ponta a ponta, há uma seletividade racial explícita que precisa ser tratada a partir do trabalho desta comissão”, disse.
A defensora pública e representante da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep) na audiência, Lucia Helena Silva Barros de Oliveira, também mostrou preocupação com a seletividade do sistema criminal. Uma das propostas trazidas por ela foi a criação de uma atenuante genérica, no Código Penal, para pessoas negras em julgamentos criminais. “Os corpos negros pagam por uma seletividade penal.”
Durante o debate, o relator da comissão de juristas, Silvio de Almeida, afirmou que o colegiado vai dar um “contorno jurídico” às sugestões para facilitar a análise pelo Congresso Nacional. “Vamos fazer o que há de melhor do ponto de vista técnico e jurídico”, declarou.
Comissão
A comissão de juristas foi criada em decorrência da morte de João Alberto, o consumidor negro espancado até a morte por seguranças em uma loja do supermercado Carrefour, em Porto Alegre, em novembro do ano passado. O grupo, formado por 20 juristas negros, tem como presidente o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Fonte: Agência Câmara de Notícias